Durante anos, “Paris, Texas” (Wim Wenders, 1984) foi “o filme” para mim. Comprei todos os livros lançados na época sobre o road movie. Um deles tinha as imagens do filme decupadas, show! (por falar nisso, não sei por onde eles andam).
A sequência inicial é perfeita: a combinação das cenas desérticas do oeste americano com o vazio do personagem principal, Travis, que caminha sem ter para onde ir. Ele está de volta depois de anos sumido e seu irmão vai ao seu encontro quando recebe um telefonema de um hospital onde Travis fora atendido. Assolado pelo sol do deserto e pela falta de memória, Travis guarda apenas as memórias do corpo. É o que responde ao irmão quando ele pergunta-lhe se ainda sabe dirigir: “Meu corpo sabe”.
Travis tem um filho e uma ex-mulher, mas estas lembranças estão ainda esmaecidas e só aos poucos vão se revelando. No final do filme, outros “desertos” se revelam: as emoções mais intensas são esvaziadas pela falta de contato. É assim no banco drive-thru em Houston (como assim existe um lugar assim?), onde Jane (Nastassja Kinski) é observada pelo filho quando entra com seu carro para fazer um depósito. É através de um vidro e pelo telefone de uma cabine que Travis conversa com Jane, que trabalha como stripper. E é através de um gravador que Travis explica ao filho por que não poderá ficar com ele. Dilacerante.
“Paris, Texas” talvez não ocupe mais o lugar de “o filme”, mas isso pouco importa.
Por: Adriana Barsotti
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